Desinstitucionalização deve ser cumprida até dezembro, mas prazo pode ser prorrogado em mais um ano
586 pessoas continuam morando nos dois manicômios em funcionamento no município - Foto: EMÍDIO MARQUES |
O Cruzeiro do Sul traz, a partir de hoje, uma série de reportagens sobre a reforma psiquiátrica na região de Sorocaba. Por abrigar sete hospitais psiquiátricos, a região foi escolhida pelo Ministério Público (MP) para firmar, em 2012, Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para promoção da desinstitucionalização dos pacientes submetidos a longos períodos de internação. O documento é assinado pelos MPs estadual e federal, Ministério da Saúde, Secretaria de Estado da Saúde e os municípios de Sorocaba, Salto de Pirapora e Piedade. Esta foi a primeira vez que as três esferas administrativas participaram da formulação de um documento desta natureza.
Nesta série, o leitor vai conhecer a estrutura da desinstitucionalização em Sorocaba, como é formada a Rede de Atenção Psicossocial (Raps), como funcionam as residências terapêuticas, o que diz a legislação sobre a proteção e direitos dos portadores de transtornos mentais e saberá da opinião de especialistas sobre a forma como o processo está sendo conduzido na cidade.
Em Sorocaba, eram quatro hospitais psiquiátricos antes da assinatura do TAC: Mental, Jardim das Acácias, Vera Cruz e Teixeira Lima. Hoje são dois estabelecimentos em funcionamento, o Teixeira Lima e o Vera Cruz, que foi transformado em Polo da Desinstitucionalização. No total, o município promoveu a reinserção social de 140 antigos moradores de manicômios e outros 586 aguardam pela volta à sociedade. O prazo para que isso aconteça, de acordo com o TAC, é dezembro deste ano.
Confira, a seguir, o primeiro dia da série sobre a Saúde Mental de Sorocaba.
Carolina Santana
carolina.santana@jcruzeiro.com.br
O prefeito de Sorocaba, Antonio Carlos Pannunzio (PSDB), afirmou em entrevista exclusiva ao Cruzeiro do Sul que o município não vai conseguir cumprir o prazo para retirar, por meio da desinstitucionalização, todos os pacientes moradores dos hospitais psiquiátricos da cidade: atualmente o Vera Cruz e o Teixeira Lima. A conclusão do processo, conforme determinação dos Ministérios Públicos (MP) Federal e do Estado, por meio de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), vence em dezembro, podendo ser prorrogado por mais um ano. Desde que teve início a desinstitucionalização em Sorocaba, em dois anos de trabalho, 140 pacientes voltaram à sociedade e estão morando em residências terapêuticas, com familiares ou retornaram para a cidade de origem. Esse procedimento ainda precisa ser aplicado a 586 pessoas que continuam morando nos dois manicômios em funcionamento no município.
No ano passado foram gastos R$ 37 milhões com a desinstitucionalização em Sorocaba. Foram R$ 16,3 milhões dos cofres municipais, R$ 20,4 milhões repassados pelo governo federal e outros R$ 190,8 mil do governo estadual. Apesar de nem o MP, nem a lei 10.216/01 (que estabelece a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais), determinarem o fechamento dos hospitais psiquiátricos, o município planeja extinguir os manicômios particulares que trabalham com recursos públicos em Sorocaba.
Por meio do TAC, assinado com o MP em dezembro de 2012, a Prefeitura se comprometeu a promover a reinserção social de todos os pacientes psiquiátricos da cidade moradores de manicômios. Na época da assinatura do documento, eram 786 moradores em três hospitais psiquiátricos que funcionavam na cidade: o Vera Cruz, o Mental e o Dr. Teixeira Lima. Outros 214 pacientes passavam por internações mais curtas, fazendo parte da chamada população flutuante. O Jardim das Acácias, gerido pela Associação Protetora dos Insanos, encerrou suas atividades antes da assinatura do TAC.
Por determinação judicial, o município passou a intervir no hospital Vera Cruz em agosto de 2013 e o manicômio foi transformado no polo da desinstitucionalização em Sorocaba. Para a gestão do Vera Cruz foi contratado o Instituto Moriah, única organização social habilitada no processo de concorrência pública. Mesmo sem experiência com hospitais psiquiátricos, o instituto assumiu o desafio de promover o processo de reinserção social com mais de 780 pacientes. Alguns deles residiam há mais de 30 anos nas instituições e tiveram de reaprender todos os aspectos da vida em sociedade, desde vestir roupas, usar talheres para alimentação, uso de dinheiro e até comportar-se em público.
Ritmo lento
Em termos percentuais, a desinstitucionalização alcançou 19% da meta inicialmente estabelecida e a falta de vagas no Vera Cruz, polo da desinstitucionalização, é um dos motivos. Segundo a coordenação de Saúde Mental do município, há muitos pacientes preparados para voltarem à sociedade: o que falta é um local para onde eles irem. Pannunzio chama atenção para o ritmo que o processo está sendo aplicado na cidade e lembra que em dois anos o município conseguiu retirar 140 pessoas dos manicômios. "Com uma média de 70 pessoas por ano, não vamos conseguir cumprir o prazo até dezembro", afirma.
Para o diretor de área da Secretaria da Saúde, Ailton Ribeiro, o processo nos dois primeiros anos aconteceu de forma mais lenta, por conta da necessidade de se estruturar a Rede de Atenção Psicossocial (Raps) do município. Segundo ele, a tendência é que a desinstitucionalização aconteça agora de forma mais ágil.
A situação de abandono familiar é uma realidade entre os pacientes moradores dos manicômios públicos. Incentivar a reinserção do doente mental na família é um dos objetivos do processo de desinstitucionalização, mas a resistência dos familiares é um obstáculo. Nesses dois anos, 13 dos 140 pacientes que deixaram os hospitais voltaram para a casa de parentes.
Notícia publicada na edição de 01/02/15 do Jornal Cruzeiro do Sul
Mais sobre o assunto:
Reportagem do Tem Notícias 2ª Edição, da TV Tem/Rede Globo de 08/07/2011 trata da visita surpresa realizada pelos membros da Comissão Especial dos Hospitais Psiquiátricos da Câmara de Sorocaba em dois hospitais da cidade e em residências terapêuticas.
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